Crítica | Ad Astra: Rumo às Estrelas

Escrito por: Jose Gabriel Fernandes

em 26 de setembro de 2019

Depois de ter nos levado à Nova York da década de 1920, com o comovente Era Uma Vez em Nova York, e às excursões de Percival Fawcett, com Z: A Cidade PerdidaJames Gray imagina um futuro não muito distante, de grandes expedições espaciais, com Ad Astra. Apesar do salto cronológico – do início do século XX para o final do XXI (?) -, o cineasta também trabalha com os limites do desbravamento, seja na busca por satisfação pessoal ou conhecimento. Em Ad Astra, porém, as duas se misturam num nível perigoso, além de ter um toque pessoal mais carregado – o que ajuda a intensificar a experiência.

Na trama, acompanhamos o astronauta e engenheiro Roy McBride (vivido por Brad Pitt) numa busca por seu pai (Tommy Lee Jones), que está perdido nas profundezas da galáxia. O veterano pode estar envolvido em uma série de apagões que colocam toda a coletividade em risco. A missão, é claro, é mero pretexto para Roy se resolver com seus demônios – ainda que inicialmente não saiba disso. Ele começa o filme completamente anestesiado, indiferente ao que acontece à sua volta, quando aceita ser usado como boi de piranha para contatar o pai.

O que começa ao estilo de um comercial de perfume caro (com direito a uma narração ecoada de Pitt) se desenvolve num envolvente drama existencial, muito graças à entrega do ator. Seus sentimentos enclausurados estão completamente manifestos no olhar marejado e expressividade contida, e a narração, que a princípio pode parecer exposição desnecessária, acaba aderindo uma poética maior à melancolia do protagonista (muito provavelmente pela conveniência e qualidade plástica das falas). É particularmente tocante ver o personagem não conseguindo segurar seus sentimentos em situações de maior vulnerabilidade.

Outro componente importante é o próprio roteiro, que se foca nessa evolução de um homem alheio a tudo, marcado por inseguranças e traumas pessoais, a alguém que deve amadurecer e tomar responsabilidade por algo. Fala muito de questões geracionais que vira e volta vêm à tona – o fato de termos de lidar com os erros de gerações anteriores e a difícil tarefa de enfrentar o passado para construir um futuro melhor para todos. Através do personagem de Tommy Lee Jones, numa atuação breve e precisa, com um olhar completamente perdido em sua própria alienação, mostra as consequências de um desenvolvimento desenfreado, que deixa de ser favorável à humanidade e passa a atender interesses egocêntricos e pouco producentes.

Toda essa jornada, extremamente relacionável e tocante, é marcada por uma série de acontecimentos de alta periculosidade, que proporcionam uma experiência mais enervante. Nesse sentido, os excelentes efeitos visuais e o detalhista design de som são postos à prova, e garantem a imersão do espectador, com um bom uso da câmera subjetiva em momentos pontuais. As sequências no espaço, no geral, são enquadradas de forma a realçar a escala entre humanos e planetas ou naves espaciais, o que dá uma epicidade para a obra (em contraste com os planos mais fechados e intimistas, de quando McBride está sozinho). Alguns elementos da trama, como a presença de piratas espaciais e outras coisas mais aleatórias, podem parecer um pouco gratuitos, mas não deixam de ser divertidos. Afinal, o que é uma aventura sem uma boa dose de perigos absurdos?

Além de Lee Jones, o elenco de apoio conta com nomes como Ruth Negga e Donald Sutherland, e ambos estão ótimos, só que não possuem tempo de tela suficiente para causar impressão maior – e nem precisariam, porque a trama é completamente centrada em Pitt. É uma excelente plataforma para o ator, evidenciando todo o seu talento e fazendo dele um potencial competidor de peso para a próxima temporada de premiações (claro que tudo é uma questão de campanha). Outra estrela é o diretor de fotografia, Hoyte Van Hoytema, que já tinha trabalhado com temática similar em Interestelar (2014), mas aqui tem a possibilidade de retratar mais nuances, com um desenho de luz belíssimo, uma paleta de cores um pouco mais diversificada e um tom gélido bastante apropriado.

Ad Astra: Rumo às Estrelas é mais um bom exemplo de como um gênero popular e de alto apelo comercial consegue abarcar discussões relevantes sem abrir mão de sua identidade. Merece um lugar ao lado de outros clássicos de aventura espacial, como 2001: Uma Odisseia no Espaço e Solaris, e nos mostra a versatilidade de James Gray como realizador.

Crítica | Ad Astra: Rumo às Estrelas
Com Ad Astra, James Gray nos leva a uma jornada pelas profundezas da psique humana, sob o pretexto de um longa de exploração espacial. Acaba abordando temas de alta relevância social e existencial, mas sem deixar de lado o valor de entretenimento, com sequências de ação de tirar o fôlego, além de efeitos visuais e sonoros extremamente palpáveis. A atuação introspectiva de Brad Pitt é a alma do filme, fundamental para o funcionamento da proposta.
4.5

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