Crítica | Cherry – Inocência Perdida

Escrito por: Gabriel Santos

em 14 de março de 2021

Tom Holland é conhecido mundialmente pelo seu papel como Peter Parker nos filmes da Marvel Studios, porém vem mostrando, em obras recentes, que pode ser mais do que o Amigão da Vizinhança. O ator interpretou personagens mais complexos e sombrios, que fogem do arquétipo de mocinho, em O Diabo de Cada Dia e Cherry, a nova produção original do Apple TV+. Seu último projeto é o primeiro dirigido pela dupla Anthony e Joe Russo desde Vingadores: Ultimato, o que por si só gera muita expectativa. Baseada na vida e no livro homônimo de Nico Walker, a trama acompanha um soldado do Exército dos EUA que sofre de estresse pós-traumático, fica viciado em heroína e passa a assaltar bancos.

A história, dividida em cinco capítulos, é contada do ponto de vista do protagonista, adotando estéticas diferentes para cada estágio de sua vida, fazendo até parecer que são cinco filmes diferentes em um, segundo a proposta dos diretores. Por exemplo, é alterada a proporção da tela em um dos segmentos, assim como há mudanças de tom conforme o longa progride. Enquanto a primeira hora aborda o romance entre Cherry e Emily, seu treinamento no Exército e a guerra de fato, a segunda metade foca na volta para casa, no trauma que o protagonista precisa enfrentar e seu vício em drogas. Mesmo com mais de duas horas e vinte, a montagem é efetiva e a trama sempre está em movimento, apesar de alguns capítulos serem bem mais longos que outros.

Tom Holland mostra mais uma vez como é um ator versátil, aqui vivendo um personagem intenso e com muitas camadas. Ele consegue arrancar lágrimas do público nos momentos mais dramáticos, além de fazer com que torçamos por ele graças ao seu carisma. Como protagonista, Cherry é quem ganha mais profundidade e desenvolvimento, onde acompanhamos sua vida sendo destruída aos poucos por causa das decisões que toma, passando por sofrimento e desespero. A história conta com várias intromissões externas, seja em voice over ou pelo próprio personagem falando diretamente com o público, mostrando como ele se sentia naquele momento, trazendo reflexões ou apenas descrevendo os eventos. Ciara Bravo é outro destaque, havendo muita química entre ela e Holland, além de também passar por uma degradação gradual. Nesse caso, de uma menina inocente e com sonhos para uma viciada – ressaltado pelo trabalho da equipe de maquiagem.

A fotografia é um ponto muito importante, não apenas por criar um história visualmente bonita, como também para ajudar a conduzir a narrativa, tanto de maneira simbólica quanto explícita. Há cenas onde personagens não são iluminados propositalmente, o que chega a lembrar uma peça de teatro, assim como em outras a ausência de luz cria maior dramaticidade. Também me chamou atenção o excesso de sequências contemplativas, em câmera lenta, assim como o uso recorrente do contraste da música clássica em tragédias.

Também é bom lembrar que este é filme muito pesado, não necessariamente pela violência gráfica, mas pela história que é contada, fazendo parte da proposta. Por exemplo, na sequência da guerra é interessante vermos tudo pelo ponto de vista de alguém sem experiência e de baixa patente, mostrando o lado cru e menos glamouroso do conflito, onde não há heróis, apenas o horror de ver pessoas morrendo a todo momento.

Cherry é uma experiência melancólica que poderia ter alguns minutos a menos, mas se diferencia pelas escolhas artísticas e ótimas atuações. No fim, me parece que a mensagem do filme é “não entrem para o exército”, como o próprio protagonista alerta, abordando o transtorno do estresse pós-traumático de forma explícita, só que não tão pessimista como poderia ter sido.

Crítica | Cherry – Inocência Perdida
A produção aborda o transtorno do estresse pós-traumático de forma explícita, chamando atenção pelas escolhas artísticas e pelas atuações de Tom Holland e Ciara Bravo.
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