Crítica | O Exterminador do Futuro: Destino Sombrio

Escrito por: Jose Gabriel Fernandes

em 30 de outubro de 2019

Uma jovem e desesperada Sarah Connor – personagem icônica de Linda Hamilton – fala sobre o devastador futuro que a humanidade aguarda. A gravação rústica, simulando uma câmera de segurança, parece tirada de um interrogatório e já causa apreensão – como se um fantasma do passado tivesse revivido e só soubéssemos disso através de algo que não deveríamos estar vendo. É assim, com o pé na porta, que O Exterminador do Futuro: Destino Sombrio começa. Além do efeito citado, a cena, acima de tudo, nos lembra do talento da atriz.

No sexto capítulo de sua franquia, James Cameron (agora na cadeira de produtor) tenta dar um restart definitivo nessa história sobre máquinas, humanos e o que há no meio. Diferentemente de Gênesis (2015), o longa se preocupa em apresentar novas protagonistas, ao mesmo tempo que aproveita parte importante do elenco antigo. A participação de Arnold Schwarzenegger é um agradável aceno aos fãs, mas é Hamilton que divide o protagonismo do longa com Mackenzie Davis e Natalia Reyes, e possui as cenas que mais exigem de seu alcance emocional.

A trama segue premissa similar à dos primeiros filmes (dois viajantes do tempo disputando a vida de uma jovem vulnerável) e dá segmento à trajetória de Connor de maneira inesperada, adicionando novas camadas à sua relação com T800. Por mais que essa subtrama seja interessante pela forma como subverte a dinâmica entre os dois veteranos e lida com conceitos relativos a vingança e redenção, é também um problema, uma vez que reduz a objetividade da trama central. O filme deixa de ser aquele jogo primal – mas autossuficiente  – de sobrevivência, e acaba tendo de amarrar diferentes pontos, o que pede uma boa vontade maior do espectador.

Ao mover do ponto A para o B para o C, acaba ficando um tanto repetitivo e até inchado. As cenas de flashback (ou seriam flashforwards?) e falas expositivas, repletas de informações novas e, por vezes, de caráter técnico, não ajudam no efeito. Muito poderia ter sido reduzido com cenas mais concisas e uma economia de detalhes mais inteligente. Há dados vitais para a trama, mas não tem motivos para mostrar tudo ou, pior, guardar algumas até o final como se fossem surpresas (e dificilmente surpreenderem mesmo). “Protocolar” talvez seja a palavra que melhor defina esses momentos.

Tirando isso, e outros elementos que subestimam a inteligência do espectador (como sons estrategicamente colocados para tornar algo ainda mais aparente), o roteiro propõe atualizações necessárias com relação à representatividade feminina e o papel do poder público – no último caso, levando-nos até mesmo a um centro de detenção de imigrantes. Assim, não só evidencia a ausência das autoridades, como também as colocam como obstáculos facilmente manipuláveis pelas forças destrutivas da Legião (uma alternativa à Skynet que mostra como o ser humano está fadado a repetir os mesmos erros sempre).

Além dessas mudanças, que são até mais conservadoras do que poderiam ter sido, o longa acerta na escalação de Mackenzie Davis, num papel completamente fora de sua zona de conforto. Sua presença imponente e estilo combativo fazem dela uma perfeita heroína de ação, que também carrega um lado mais sensível e humano, constantemente presente em suas ações. Natalia Reyes, por outro lado, é mais frágil, só que acaba se fortalecendo com as circunstâncias à sua volta. Ainda que sejam inserções chamativas e, por vezes, deslocadas de sua personalidade inicial, são convincentes por serem reações às dificuldades que enfrenta.

Outra adição significativa é Gabriel Luna, num papel que já vimos em outros longas da franquia, como os próprios trailers indicam. Não é muito mais do que um upgrade interessante do T-100, apesar do ator conseguir demonstrar bastante versatilidade dentro das limitações do personagem. Às vezes tem que simular traços de personalidade bastante distintos, ainda mantendo uma essência robótica desconcertante.

O vilão se destaca mesmo, porém, na ação, que é naturalmente bem conduzida pelo diretor Tim Miller (do primeiro Deadpool), ainda que um pouco genérica demais. Das sequências de confronto, a mais impactante definitivamente é a primeira, que vai de uma fábrica à estrada. Há uma tensão que vai aumentando desde o início, e, quando descamba para a agressão, apresenta uma coreografia fluida e brutal, com uma empolgante alternância entre ferramentas de combate (de uma shotgun a uma marreta). Já a perseguição entre veículos na estrada se destaca pela decupagem precisa e movimentação turbulenta remetente ao T2 e até mesmo Mad Max (e um fechamento digno dessa qualidade). Depois disso, é só mais do mesmo, com exceção da última briga, que apresenta algumas das virtudes da primeira.

Quanto às tecnicalidades, o som e a fotografia são funcionais para a proposta, mas nada de muito particular. Os efeitos visuais, por outro lado, impressionam, principalmente no rejuvenescimento de alguns personagens. O design de produção dialoga perfeitamente com o que já vimos em outros longas da franquia, mantendo o senso de unidade desses filmes intactos (apesar da trama só considerar mesmo os dois primeiros).

Para os fãs de Exterminador do FuturoDestino Sombrio certamente deve preencher a lacuna deixada desde 1991. Ele consegue encontrar um equilíbrio saudável entre nostalgia e renovação, assim como outros revivals desta década (Star WarsBlade Runner e Rocky sendo, talvez, os mais notáveis). Apesar disso, isoladamente, talvez não se destaque pela falta de objetividade e concisão do roteiro, algo que era tão vital para o início da franquia e o gênero como um todo. Se o aumento da escala da aventura fosse proporcional ao nível de atratividade da trama, não seria um problema, mas o longa está longe de cumprir isso, até mesmo em nível de execução. Ainda assim, os acertos sustentam o conjunto da obra.

Crítica | O Exterminador do Futuro: Destino Sombrio
O Exterminador do Futuro: Destino Sombrio segue a tendência cíclica dos revivals desta última década, recontando a história dos clássicos com o retorno do elenco original e a adição de personagens novas. O bom desempenho das atrizes (especialmente Linda Hamilton e Mackenzie Davis) e a execução competente permitem que a proposta funcione, mas o roteiro carece da objetividade potencializadora dos primeiros filmes.
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